A melhoria dos índices de saneamento básico é um dos grandes desafios do Brasil neste século 21. Nessa busca pela universalização dos serviços de água e de esgoto, um aspecto extremamente importante é o aperfeiçoamento dos mecanismos e órgãos de regulação do saneamento básico.
O avanço do saneamento básico no país está intrinsecamente ligado a uma série de fatores. Entre os mais notórios estão o aumento da cobertura das redes de água e de esgoto, a melhoria da qualidade dos serviços, a diminuição das perdas físicas de água tratada e a eficiência operacional dos sistemas de abastecimento e tratamento.
Mas a transformação do saneamento básico nacional passa, também, pela qualidade e eficiência dos serviços de regulação, que impactam diretamente em todas as frentes do sistema de água e esgoto.
Por essa importância, recentemente o Instituto Trata Brasil produziu o estudo “Qualidade da Regulação do Saneamento no Brasil e Oportunidades de Melhoria”, material que se debruça sobre o urgente tema socioambiental e as mudanças estabelecidas pelo Novo Marco Legal do Saneamento (Lei Nº 14.026).
Saneamento Básico: o Papel das Agências Reguladoras
A tarefa das agências reguladoras de serviços de saneamento básico do país, hoje, quase dois anos após a criação do Novo Marco Legal do Saneamento, é de suma importância para uma nação que estabeleceu como objetivos – até o ano de 2033 – a universalização do abastecimento de água e 90% de coleta e tratamento de esgoto.
Hoje, o Brasil ainda possui quase 35 milhões de pessoas sem abastecimento de água tratada. E cerca de 100 milhões de habitantes não têm acesso aos serviços de coleta de esgoto. Mais um dado alarmante: apenas 50% do volume de esgotos gerados no país é tratado.
Pela urgente necessidade de reversão desses indicadores, o papel das agências reguladoras tornou-se o escopo do estudo “Qualidade da Regulação do Saneamento no Brasil e Oportunidades de Melhoria” – levantamento realizado pelo Instituto Trata Brasil em parceria com a consultoria KPMG.
Como informa o Trata Brasil, a publicação aborda diversas frentes dos serviços de regulação no Brasil, com avaliação sobre as entidades reguladoras locais, faz um benchmarking internacional (trazendo dados de países como Chile, Colômbia e Portugal) e um balanço sobre o benefício ao consumidor.
A pesquisa envolveu dados e informações coletados junto a 15 agentes reguladores (5 municipais, 5 intermunicipais e 5 estaduais), que são responsáveis pela regulação de serviços de saneamento básico que atendem uma população aproximada de 39 milhões de brasileiros, ou cerca de 19% da população do país.
Regulação do Saneamento no Brasil
A gestão e a melhoria das condições de saneamento básico no Brasil são de responsabilidade da União, Estados, municípios e do Distrito Federal, de acordo com a Constituição Federal de 1988.
No território nacional, as agências reguladoras são os órgãos (autarquias de regimes especiais) responsáveis pelas regras que norteiam o saneamento básico e pelo equilíbrio que envolve a prestação dos múltiplos serviços públicos e privados à população.
Cabe lembrar que o tema regulação do saneamento básico é relativamente novo no Brasil, pois só foi instituído em 2007 com a Lei Nº 11.445, de 05 de janeiro de 2007, que estabeleceu “as diretrizes nacionais para o saneamento básico e para a política federal de saneamento básico”.
Hoje, o país possui mais de 70 agências reguladoras na área de saneamento básico. E desde a instituição do Novo Marco Legal do Saneamento, a ANA tornou-se o órgão regulatório federal com competência para editar normas de referência para a regulação dos serviços públicos de saneamento básico. Após 2020 sua denominação passou a ser Agência Nacional de Águas e Saneamento (ANA).
Breve Diagnóstico da Regulação no País
Um dos temas abordados pelo estudo do Trata Brasil foi a questão do reajuste das tarifas dos serviços e a inadimplência dos consumidores brasileiros (especialmente aqueles em situação de vulnerabilidade social) desde o início da pandemia da Covid-19.
De acordo com o levantamento, o reajuste tarifário – cuja responsabilidade é das agências reguladoras, operadores de saneamento básico e governos – não aconteceu por parte de 10 agências (67%) pesquisadas no relatório.
Além disso, cidades como, por exemplo, Manaus (AM), Porto Velho (RO), Belém (PA), Boa Vista (RR), São Luís (MA), Teresina (PI), Natal (RN), Cuiabá (MT) e Porto Alegre (RS) instituíram leis proibindo a suspensão ou interrupção de fornecimento de serviços públicos, inclusive serviços de água e esgoto, diretamente relacionados ao estado de calamidade pública decretado pelos Estados Municípios.
Um apontamento importante do estudo foi a dificuldade de fiscalização (em campo) dos serviços de saneamento, que foram parcialmente ou totalmente interrompidos com o início da pandemia. Esse fato põe em risco a qualidade dos serviços de saneamento básico, avaliam os realizadores da pesquisa.
O estudo “Qualidade da Regulação do Saneamento no Brasil e Oportunidades de Melhoria” também abordou a questão da governança nas agências reguladoras.
Entre as agências ouvidas, 60% responderam que a presidência é um cargo que não é escolhido por eleição. Já 53% delas afirmaram que, para assumir cargos de diretores ou dirigentes, os(as) profissionais não precisam comprovar experiência com o saneamento básico ou regulação.
Outro tópico do estudo foi o envolvimento da população nas discussões envolvendo a oferta de serviços de saneamento básico nas cidades, especialmente quanto à cobrança das tarifas.
De acordo com 80% das agências reguladoras participantes do estudo, as análises tarifárias são submetidas a consultas públicas e todos esses estudos são apresentados em audiências públicas.
Contudo, somente 47% das agências reguladoras afirmaram que são realizadas consultas públicas para os regulamentos dos prestadores.
Na esfera da transparência, 73% das agências informaram que publicam relatórios de fiscalização dos serviços de saneamento em seus sites. E 100% delas afirma que possui o canal de Ouvidoria.
Regulação: em Busca da Excelência
O estudo também lista seis boas práticas das agências reguladoras de serviços de saneamento básico, que são apresentadas como a chave para a melhoria de sua eficiência e a melhor interação com a sociedade.
As boas práticas dos entes reguladores dos serviços de saneamento básico são as seguintes:
- Garantir a distribuição de água com qualidade, a coleta e o tratamento de esgoto
- Programar uma Agenda Regulatória (planejamento, fiscalizações, revisões tarifárias e outros)
- Acompanhar a qualidade dos serviços através de indicadores de saneamento
- Incentivar a pesquisa e o desenvolvimento para modernização do setor de saneamento
- Capacitar as equipes dos prestadores de saneamento através de treinamentos continuados
- Garantir a disponibilidade de água para atual e futuras gerações.
A íntegra do estudo “Qualidade da Regulação do Saneamento no Brasil e Oportunidades de Melhoria” (em PDF) está disponível no link: